A CABEÇA DE KADHAFI

sexta-feira, 15 de abril de 2011



A declaração conjunta dos chefes de Estado dos E.U.A, Reino Unido e França tem uma leitura bem clara: não está a correr bem a guerra na Líbia.
Os rebeldes estão longe de ter a representatividade e apoio que se pensava e nem com o apoio aéreo dos países ocidentais têm sido capazes de derrotar o líder Líbio.
As forças leais a Kadhafi – pelos vistos mais leais do que se esperava – tem derrotado facilmente os rebeldes sempre que cessam os ataques aéreos: é ver as inversões de marcha das Pick-Ups em debandada geral sempre que terminam os ataques aéreos e o exército de Kadhafi recupera fôlego.
Os governos dos E.U.A, Reino Unido e França, em vez de tirarem as ilações devidas, continuam a pretender derrubar Kadhafi a todo o custo, nem que tenham que violar a resolução do Conselho de Segurança das Nações Unidas (nada de novo, infelizmente).
Até para os mais cépticos estará agora claro que o objectivo inicial sempre foi derrubar/matar Kadhafi.
Se é essa a solução que a maioria dos Libios quer, já não é assim tão certo.
Num país tribal em que a união era assegurada pelo ditador Kadhafi, o Ocidente deveria preocupar-se em assegurar uma solução pacífica, com a realização de eleições sob a supervisão da comunidade internacional, de modo a não criar mais um foco de instabilidade nos países árabes.
Mas isso tinha um risco para o Ocidente: Kadhafi poderia vir a ser eleito.
Isso não interessa, seria um vexame e um revés nos interesses dos E.U.A, Reino Unido e França. A cabeça de Kadhadi é a solução.
O que esses países deveriam fazer era tirar ilações da guerra no Afeganistão e perceber que pouco adianta para a estabilidade política de um estado árabe ter um governo fantoche apoiado pelo Ocidente sem qualquer apoio popular.
O que se vai criar na Libia, à força, é mais um estado instável.
A ver vamos.

Miguel Salgueiro Meira

METENDO A CIDADANIA NA GAVETA

segunda-feira, 11 de abril de 2011




Para milhares de portugueses que nas últimas presidenciais votaram em Fernando Nobre, a notícia de que ele irá encabeçar a lista de deputados do PSD, por Lisboa, às próximas eleições legislativas foi como um punhal afiado cravado nas costas.
Acreditando no candidato que dizia ser contra o actual sistema partidário, os seus eleitores tiveram a ilusão de estarem a confiar o voto a alguém que, de facto, se demarcava daqueles partidos e que combatia a lógica de tacticismo e oportunismo que neles grassa.
A alusão constante de Nobre à cidadania - que a sua candidatura pretendia encarnar em detrimento da política partidária - granjearam-lhe a simpatia de milhares de pessoas.
Só por isso Fernando Nobre teve os votos que teve, dando um sinal claro de descontentamento aos partidos.
Ainda há pouco tempo Nobre dizia “Em Maio (…) tornarei pública a decisão que, repito, já tomei. Ela exclui em definitivo (…) a aceitação de qualquer cargo de nomeação político-partidária”.
Quem nele votou não estava, por isso, arrependido.
Essa ausência de arrependimento terminou no passado Domingo, como se pode ler nas centenas de mensagens de descontentamento deixadas no Facebook de Fernando Nobre.
Em poucos meses ele deu o dito por não dito – conduta típica da política partidária.
Nobre trocou a cidadania independente pela independência num partido.
A opção de Nobre é um duro golpe naqueles que acreditam nas possibilidades da cidadania em democracia.
O cúmulo é que, em caso de vitória, o PSD vai-lhe oferecer o lugar de Presidente da Assembleia da República – precisamente a figura constitucional que representa o porta-voz dos representantes dos cidadãos.
Quem assim tratou a cidadania independente não merece mais nada a não ser desprezo.

Miguel Salgueiro Meira

Publicado integralmente na edição de 12 de Abril de 2011 do jornal "Publico", pag.34.
Publicado parcialmente na edição de 12 de Abril de 2011 do jornal "Diário de Notícias", pag. 9.