PARA ALÉM DO NECESSÁRIO - nova exploração humana em tempo de crise.
É sabido o aumento exponencial do número de
desempregados em Portugal nos últimos anos.
Segundo dados do Instituto Nacional de Estatística
revelados na passada quarta-feira, a taxa de desemprego subiu para 16,9% no
último trimestre de 2012.
Só no espaço de um ano (de 2011 para 2012) a
população desempregada aumentou 21,8%.
Quem percorre os tribunais, há muito se apercebeu que
os seus placards são já insuficientes para afixar os editais que anunciam a
insolvência das empresas, estando os mesmos a ser já colados nas suas paredes.
Depois do caos das finanças, a economia portuguesa,
no frenesim da austeridade, naufraga lentamente.
As consequências sociais são enormes.
Os preços não deixam de subir, e os salários (por
força do aumento da carga fiscal e da inflação) não deixam de perder valor
real.
As prestações para amortização dos créditos bancários
a que tantos foram aliciados, essas, não descem.
Aumenta o recurso das famílias portuguesas a
instituições de solidariedade social para obterem uma refeição.
Há famílias em que todos os elementos do agregado
familiar perderam o emprego.
As opções políticas até agora tomadas são de
censurar. Mas nem só a classe política tem responsabilidades no que actualmente
se está a passar.
Empresários sem escrúpulos cavalgam a onda da
austeridade.
Muitos deles, a pretexto da crise económica e
financeira do País, têm aproveitado para apresentar as suas empresas à
insolvência para, dessa forma, deixarem de pagar os seus débitos, criando novas
empresas para continuarem a laborar sem passivo. Outros, por seu turno,
aproveitam aquele contexto para diminuir o número de trabalhadores.
O sector da construção civil tem sido dos mais
afectados.
Para além do drama dos jovens que não obtém emprego,
um drama maior ainda surge para aqueles portugueses de meia-idade que, perdido
o emprego, seguramente não conseguirão – atenta a idade – obter trabalho.
Muitos, até agora, procuraram garantir a sua subsistência
saindo do país, nomeadamente para Angola.
Mas recentemente um novo fenómeno de exploração
parece estar a surgir.
Muitas empresas nacionais preparam-se para fechar
portas ou reduzir ao mínimo a sua presença no nosso país e continuar a laborar
apenas no estrangeiro, promovendo despedimentos colectivos.
E a proposta que estão a fazer aos trabalhadores a
despedir é a de lhes dar trabalho no estrangeiro, mas apenas pelo valor do
salário que auferiam cá em Portugal e já não pelo valor dos melhores salários
que sempre foram pagos aos trabalhadores deslocados no estrangeiro,
nomeadamente em Angola.
Assim, aquilo que alguns empresários se preparam para
fazer é celebrar contratos de trabalho verdadeiramente usurários, explorando o
estado de necessidade dos desempregados portugueses para, desse modo, obterem
uma redução de custos com o pessoal, aumentando dessa forma o seu lucro,
repercutindo, mais uma vez, os custos da crise nos trabalhadores portugueses.
Urge que os responsáveis políticos, incapazes de
garantir a retoma da economia e a diminuição do desemprego cá dentro, adoptem
medidas susceptíveis de combater esta exploração dos tempos modernos.
Publicado na edição de 23 de Fevereiro de 2013 do jornal "Público", pag. 44, "Cartas à directora".