A GREVE GERAL DE 24 DE NOVEMBRO

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Num interessante artigo de opinião publicado na edição do PUBLICO de 16 de Novembro, o jornalista Miguel Gaspar discorreu sobre a greve geral que se avizinha.
Fazendo uma análise certeira de muitos dos problemas do país, o jornalista, muito embora reconheça que “Uma greve geral não resolve nada”, defende a necessidade desta para “a sociedade dizer que não morreu”.
Acertando no diagnóstico, Miguel Gaspar erra na terapêutica.
O nosso país está falido. Essa declaração de falência só ainda não foi dada, não tanto por nossa causa, mas para protecção do Euro.
Com um país a necessitar urgentemente de dinheiro e de trabalho que o produza, como é possível convocar e defender uma paralisação geral?
O prejuízo económico que a greve geral acarretará é enorme. Só em coimas rodoviárias perder-se-ão, no mínimo, 1,5 milhões de euros (cfr. edição do PUBLICO de 8 de Novembro).
O que pretendemos, então, com a greve geral? Abrir ainda mais a vala comum onde nos meteram?
Se a greve geral não resolve nada para quê persistir nela?
Para avaliar a “capacidade de mobilização dos sindicatos”? E o que lucramos nós com isso?
Há muito tempo que os sindicatos desfasaram a sua luta da realidade, tendo sido incapazes de ver mais além do que o imediato.
Os sindicatos acenavam bandeiras por melhores salários, quando, na verdade, a luta era já pela manutenção dos empregos e contra a deslocalização de empresas.
Agarrados a clichés revolucionários já gastos, os sindicatos deixaram-se ultrapassar pela realidade social e foram incapazes de garantir um compromisso social sério que garantisse a sustentabilidade da nossa economia.
Aderir a uma greve geral para dar projecção pessoal a líderes sindicais que apenas se destacam na desgraça alheia em nada resolverá a situação dos portugueses e do País.
Ninguém esquece que a seguir à greve geral de 1988 um dos líderes das centrais sindicais foi “promovido” a deputado europeu.
Não é disso que precisamos. Não é isso que nos resolve problemas.
Há outras formas de os portugueses mostrarem o seu descontentamento que não a greve geral.
A maioria dos portugueses sabe bem que o país está no “fundo do poço” e que medidas de austeridade são inevitáveis.
Não é isso o que povo censura nas mesas dos cafés.
O que ele censura é que os políticos tenham gerido mal o nosso país, tenham esbanjado o dinheiro dos nossos impostos, tenham vivido na promiscuidade das negociatas que as relações do poder lhe proporcionavam nos negócios do Estado e que agora exijam sacrifícios ao mesmo: o “Zé povinho”.
É isto que ninguém perdoa.
E não venha o Dr. Luís Filipe Meneses dizer que “Quem comeu a carne deve roer os ossos”, porque o seu partido também partilhou do banquete.
Quem sempre roeu os ossos foi o povo.
Por isso, não precisamos de uma greve geral cuja única consequência será agravar ainda mais a nossa situação económica.
Se a sociedade quer dizer que não morreu, poderá sair à rua no próximo domingo, dia 28, numa manifestação pacífica, mostrando à classe política a sua indignação pela forma como nos vem governando há mais de 30 anos.
Uma verdadeira e genuína manifestação de massas.
Com trabalhadores e não trabalhadores. Com jovens sem emprego e reformados de pensões miseráveis.
Protestando. Mas sem paralisar o país e sem agravar a situação económico-financeira, cavando mais fundo a cova onde nos meteram.
E, a seguir a essa manifestação, outra se impõe.
Uma maciça adesão ao próximo acto eleitoral para uma enorme votação em branco, de modo a que a classe política perceba, de uma vez por todas, que se querem manter o sistema democrático-partidário devem mudar de rumo.
Seguramente que essas manifestações demonstrarão bem que a sociedade não morreu sem acarretar os efeitos negativos de uma greve geral.

Miguel Salgueiro Meira

Publicado na edição de 19 de Novembro de 2010 do jornal PUBLICO (pag. 48)

PORTUGAL, A CHINA E OS DIREITOS HUMANOS

segunda-feira, 8 de novembro de 2010


Hu Jintao, o Homem mais rico do planeta – segundo a Forbes – aterrou em Figo Maduro para visitar um dos países mais pobres da Europa – o nosso.
No espaço de menos de um mês, Portugal foi visitado por dois líderes comunistas: Chavez e Jintao.
Há 25 anos atrás a visita destes dois líderes teria uma leitura política: a “colagem” ao bloco de leste.
Hoje, porém, a leitura é tão só e apenas económica: a necessidade urgente de tirar Portugal do “buraco”.
Daí que, na ausência de crédito do nosso País noutras praças, tenhamos que estender as mãos a quem as estende para nós.
Assim, às buzinadelas descontraídas de Chavez à chegada aos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, seguiu-se a recepção com pompa e circunstância a Hu Jintao.
A diferença na recepção dos dois não é obra do acaso.
O anúncio de que a China poderia estar interessada em adquirir dívida pública portuguesa, tornou a visita do Presidente Chinês ao nosso País especialmente apetitosa.
Daí que tudo fosse feito para agradar ao sr. Hu Jintao.
A Amnistia Internacional pretendeu organizar uma manifestação – pacífica, sublinhe-se – para demonstrar ao Presidente da China a sua insatisfação com a violação de direitos humanos nesse País e exigindo a libertação de pessoas que aí estão presas por delito de opinião.
No entanto, foi impedida de exercer esse seu direito fundamental de manifestação e expressão pelo governo civil de Lisboa, o qual não autorizou a realização daquela manifestação pacífica.
A justificação dada para a proibição - que se tratava de uma “contra-manifestação” à manifestação da comunidade chinesa - é anedótica e ridícula.
A verdade é que os interesses económicos acabaram por espezinhar os direitos humanos. Mas não só os direitos humanos dos chineses.
Foram os nossos direitos fundamentais de expressão e manifestação que foram violados pelo nosso Estado.
Compreende-se que, perante a nossa actual situação económica-financeira, se procure ajudar e cativar todos aqueles que nos possam ajudar.
No entanto, convém não esquecer que os fins não justificam todos os meios.
Se o Estado vai começar a retirar os nossos direitos fundamentais perante o estado de necessidade economica em que vivemos, entramos num pernicioso caminho.
Tanto mais que a situação economica do País não será nada famosa nos próximos tempos.
E sobretudo se pensarmos que a pujança económica da China se deve muito ao recurso a mão-de-obra barata (para não dizer escrava) dos seus cidadãos.
Estejamos, pois, vigilantes.

Miguel Salgueiro Meira

Publicado na edição do jornal PUBLICO de 9 de Novembro de 2010, no espaço "Cartas à Directora"
Publicado parcialmente na edição de 13 de Novembro de 2010 do jornal "EXPRESSO" (Carta da semana)