Contra a indiferença.

segunda-feira, 8 de março de 2010

 

A candidatura de Manuel Alegre às eleições presidenciais de 2006 representou um movimento independente relativamente aos partidos políticos, inclusivamente do Partido Socialista que se recusou a apoiar o seu militante histórico.
Os eleitores, porque começam a estar cansados dos partidos que nos governam há anos, viram na candidatura independente de Alegre e no inconformismo desse candidato um voto de protesto contra o sistema, procurando dar um sinal à democracia de que nem tudo se esgota naqueles partidos.
Manuel Alegre teve 20,72% dos votos expressos, sendo o segundo candidato mais votado.
A expressão eleitoral dos cidadãos livres que se associaram à candidatura de Alegre demonstrou ter uma força que superava a de partidos políticos, como o PS, o PCP ou o BE.
Para esses cidadãos, foi uma derrota que soube a vitória.
A consciência de que, todos juntos, tinham um poder enorme alimentou esperanças que transcendiam o acto eleitoral.
Ficou-se à espera que Manuel Alegre fizesse algo com mais de um milhão de votos que lhe foram confiados.
Falou-se na criação de um partido político. Falou-se na saída de Alegre do Partido Socialista.
Pretendia-se um sinal de ruptura com o sistema partidário e a prática política existentes.
Todos esperavam de Alegre um acto consequente com a expressão dos votos que lhe foram cofiados.
Mas Manuel Alegre não deu tão grande passo.
Militante histórico cuja identidade está ligada indelevelmente ao PS, Alegre não teve a coragem de assumir a ruptura.
E mesmo no exercício da sua actividade como deputado do PS, não fez mais do que ir tendo algumas discordâncias com o seu partido.
Na hora da verdade, Manuel Alegre esteve sempre ao lado do PS.
Nada há a censurar. É a sua identidade. Um histórico como Manuel Alegre não quererá ficar com o ónus de fracturar o PS, criando um novo PRD.
No entanto, é duvidoso que os cidadãos defraudados com Alegre lhe voltem a confiar o voto.
Esses cidadãos sabem agora que Alegre, afinal, não tem a isenção necessária para o exercício da função presidencial, pois, se for necessário tomar qualquer decisão que prejudique o PS, ele – já o demonstrou – sentir-se-á condicionado.
E é aí que Fernando Nobre poderá ser diferente.
Fernando Nobre não está vinculado a nenhum partido.
A sua natureza apartidária fê-lo já apoiar candidaturas dos mais diversos quadrantes políticos.
Nobre é um dos cidadãos portugueses contemporâneos que mais se distinguiu pelo seu espírito de serviço e pela dedicação a causas humanitárias e solidárias.
As suas lutas não são lutas de bancada ou de verbo.
Fernando Nobre luta por esse Mundo fora contra a injustiça e contra a indiferença.
Se é de admirar aqueles que, em tempos difíceis de ditadura, tiveram que abandonar o País porque eram perseguidos, mais admirável é o exemplo daqueles que, em tempos fáceis, abdicam do seu bem-estar pessoal, dando o corpo às lutas solidárias e humanistas quando poderiam estar confortavelmente sentados nas suas casas ou, quem sabe, no Parlamento.
Angustiado com a degradação da vida política e da cidadania em Portugal, Fernando Nobre sentiu dentro de si a obrigação de avançar, procurando mobilizar contra a indiferença os cidadãos decepcionados com a vida pública.
Fê-lo porque sabe – do que viu pelo Mundo fora – que quando um povo se deixa ao sabor da indiferença é meio caminho andado para o poder político dele abusar.
Alguns comentadores residentes aconselharam já Fernando Nobre a abandonar a corrida presidencial e a voltar para a AMI.
Se não tivessem existido na nossa história homens que sonharam ir mais longe do que os seus próprios passos podiam alcançar, nunca teríamos tido um passado glorioso que constitui o pouco de que nos podemos orgulhar.
Quem persegue sonhos não se deve deixar condicionar por quem transpira pesadelos.
A luta de Fernando Nobre é para que aqueles que já desistiram de votar e de se envolver na vida pública sintam que ainda vale a pena e o demonstrem confiando-lhe o seu voto.
E é também para aqueles que não se identificam com nenhum dos candidatos já existentes.
Aí cabem todos: à esquerda, ao centro ou à direita.
É uma luta pela diferença contra a indiferença.
Fernando Nobre é dotado de coragem, abnegação e espírito de serviço.
É de admirar a sua determinação.
Consiga ele mobilizar os indiferentes e já ganhou a batalha eleitoral.

Miguel Salgueiro Meira

Publicado parcialmente na edição de 6 de Março de 2010 do semanário "Expresso"

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