CALHANDRICES

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

 


Mário Crespo é, sem dúvida alguma, um dos melhores jornalistas televisivos portugueses da actualidade.
O “Jornal das 9” que apresenta na SIC NOTÍCIAS é, seguramente, um dos melhores – senão o melhor – programa informativo do País.
Aí são entrevistadas importantes figuras da cena nacional e aí se proporcionam debates relevantes sobre a actualidade política, económica e social, num programa que se destaca pela qualidade dos temas e dos intervenientes.
Não desconhecemos, no entanto, a antipatia que Mário Crespo tem pelo partido do governo. Ela é latente e indisfarçável.
Bastará recordar a entrevista ao ministro Pedro Silva Pereira, e estamos esclarecidos relativamente à simpatia do jornalista pelo governo e pelo partido que o sustenta.
E daí?
Portugal é – a Constituição assim o diz - um Estado de direito democrático baseado, entre outras coisas, no pluralismo de expressão e no respeito e na garantia de efectivação dos direitos e liberdades fundamentais.
Uma das funções da liberdade de expressão é precisamente servir de instrumento de controlo da actividade governamental e do próprio exercício do poder.
É no seio de discussões livres e abertas que se procurará atingir a verdade e desmistificar as falsas questões.
Mário Crespo tem a sua perspectiva. Não disfarça a sua animosidade com o governo. Todos o sabem. É público e notório.
Cabe a cada um avaliar com grano salis os debates e o serviço noticioso que ele nos proporciona.
Mas não caberá a ninguém silenciá-lo.
No texto “O fim da linha”, Mário Crespo relata (com a respectiva animosidade que já lhe é conhecida) que o primeiro-ministro e outros elementos do executivo presentes num alegado almoço a ele se terão referido «como sendo mentalmente débil (“um louco”) a necessitar de (“ir para o manicómio”). Fui descrito como “um profissional impreparado”».
Até aqui nada haveria a dizer dos alegados comentários: livre exercício da crítica.
Mas o caso muda de figura quando Mário Crespo alega que, no dito almoço, se referiram a ele como «como “um problema” que teria que ter “solução”».
Aqui já não se trata de opinar livremente. Aqui trata-se de silenciar quem discorda.
E isso, a ter sido sugerido, é intolerável.
A reacção que, segundo a agência Lusa, foi proferida por fonte do Ministério dos Assuntos Parlamentares é insuficiente para esclarecer esta questão.
Incumbia ao Governo tomar uma posição clara sobre se tal expressão foi ou não proferida por membros do Governo e em que contexto.
Limitar-se a referir o episódio como mais um dos “casos fabricados com base em calhandrices” é pouco para tão grave insinuação.
Por algo bem menos grave, José Sócrates instaurou uma queixa-crime contra o jornalista João Miguel Tavares.
Se tudo o que foi relatado por Mário Crespo é mentira e se se trata de mais um caso fabricado caberá ao primeiro-ministro esclarecer.
A bola está do lado dele.

Miguel Salgueiro Meira

Texto publicado parcialmente na edição do dia 9 de Fevereiro de 2010 do jornal "Diário de Notícias"

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