A UNIVERSALIDADE DOS DIREITOS DO HOMEM

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

 


Há 62 anos a Assembleia Geral das Nações Unidas adoptou e proclamou a Resolução 217A (III), da qual constava a Declaração Universal dos Direitos do Homem.
O flagelo vivido durante a guerra em muito contribuiu para a consciencialização dos povos do Mundo acerca da necessidade de reconhecer ao ser Humano direitos inalienáveis e garantir a sua protecção jurídica universal.
Como se pode ler no seu preâmbulo, o desconhecimento e desprezo dos direitos humanos conduziram a actos de barbárie que revoltaram a consciência da Humanidade.
Por isso mesmo, e com o objectivo de garantir a liberdade, a justiça e a paz no Mundo – como se haviam já comprometido aquando da assinatura da Carta de São Francisco – as Nações Unidas proclamaram a 10 de Dezembro de 1948 a Declaração Universal dos Direitos do Homem, reconhecendo a todo e qualquer ser humano a sua igual dignidade e a garantia de um leque de direitos e liberdades fundamentais, fosse qual fosse a sua nacionalidade, raça, cor, sexo, língua, religião ou opinião política.
Essa declaração – que carecia de valor jurídico vinculativo – constituiu um momento de viragem no reconhecimento e garantia dos direitos humanos.
De facto, os direitos e liberdades fundamentais tinham começado por ser reconhecidos como meros postulados filosóficos ainda no advento do Iluminismo, com os contributos de Locke, Hobbes e Rosseau.
O reconhecimento e consagração escrita desses direitos e liberdades fundamentais apenas ganhariam corpo com a era do constitucionalismo, passando a constar das primeiras cartas de direitos e constituições que foram surgindo em diversos Estados a partir do sec. XVIII um pouco por todo o Mundo, fossem eles a Declaração dos Direitos da Virginia (1776) ou a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789), em França.
Essas constituições tiveram o mérito de reduzir a letra de lei o reconhecimento de direitos e liberdades fundamentais aos seus cidadãos, direitos, esses, que eram, essencialmente, aquilo que hoje entendemos por direitos civis e políticos.
Contudo, o horror e carnificina das duas grandes Guerras Mundiais cedo fez perceber que uma protecção meramente estadual daqueles direitos não era suficiente para garantir que todo e qualquer ser humano – que não fosse cidadão de um Estado dotado de uma constituição onde tais direito fossem consagrados – visse protegida a sua dignidade humana e visse garantidos os seus direitos fundamentais.
O grande significado da Declaração Universal dos Direitos do Homem (DUDH) não foi, por isso, o reconhecimento ex novo de um conjunto de direitos fundamentais inerentes ao ser humano.
O seu grande contributo foi o reconhecimento de que tais direitos eram universais e deveriam ser reconhecidos a todos os povos do Mundo, fosse qual fosse a sua nacionalidade ou modo de organização do seu estado (artº. 2º da DUDH).
Contudo, o carácter universal desses direitos não foi consensual logo em 1948.
Dos 56 Estados que na altura se faziam representar nas Nações Unidas, 8 abstiveram-se: URSS, Polónia, Ucrânia, Bielorrússia, Checoslováquia, Jugoslávia, África do Sul e Arábia Saudita.
Durante as seis décadas de existência, a DUDH resistiu a diversas tentativas da sua relativização.
Escudando-se no argumento da diferença cultural, muitos foram os Estados que negaram a universalidade dos direitos contidos na DUDH.
Só os estados árabes e muçulmanos contam já com diversas declarações universais: a Declaração Islâmica Universal dos Direitos do Homem (1981), a Declaração dos Direitos Humanos do Islão (1990 - adoptada pela Organização da Conferência Islâmica) e a Carta Árabe dos Direitos Humanos (1994).
No entanto, ainda há mulheres que continuam a ser condenadas ao apedrejamento em países árabes.
E ainda há presos que continuam a ser torturados em solo norte-americano.
A Declaração Universal dos Direitos do Homem – cujos preceitos são hoje reconhecidos como parte do costume internacional (ius cogens) – é, sem dúvida alguma, um marco e instrumento essencial de defesa dos direitos humanos.
Mas, o seu objectivo principal está longe de estar plenamente alcançado: a garantia dos direitos e liberdades fundamentais a todo e qualquer cidadão do Mundo.
O combate pela universalidade dos direitos humanos é, por isso, um logo caminho ainda a percorrer.


Miguel Salgueiro Meira

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